A Reitoria da Uerj disponibilizou no Sistema Eletrônico de Informações, SEI-RJ, a assinatura de um convênio entre a universidade, por meio do Hospital Universitário Pedro Ernesto (Hupe), e a União, por meio do Ministério da Saúde. O acordo, assinado pela reitora da Uerj, Gulnar Azevedo e Silva, e por Etel Matiello, coordenadora-geral de gestão de pessoas do Ministério da Saúde, foi assinado em 25/03/2024 (no documento consta erroneamente a data de 25/03/2023, quando Gulnar de Azevedo e Silva não havia sequer sito eleita para o cargo de reitora da Uerj) e disponibilizado no SEI-RJ apenas no dia 05/06, visa possibilitar a cessão de servidores entre as partes em um período de 60 meses, prorrogáveis por mais 60.
Se o objeto do convênio é “fortalecer o Sistema Único de Saúde”, o SUS, o mesmo causa o efeito contrário e agudiza o cenário de caos na saúde pública do Estado do Rio de Janeiro. A Diretoria Executiva do Sintuperj realizou uma profunda análise desse convênio e aponta cinco pontos críticos do mesmo, defendendo que a reitoria da Uerj revogue o mesmo imediatamente:
Ponto 1: O convênio assinado aprofunda o desmonte da rede hospitalar do SUS no Estado do Rio de Janeiro
Nos últimos meses está ocorrendo na rede pública federal de saúde existente no Estado do Rio de Janeiro um processo profundo de desmonte. O Hospital Federal dos Servidores do Estado, no Centro, está sendo passado para a administração da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, Ebserh, sob a gestão da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio). Além das duras críticas à gestão da Ebserh feitas pelas entidades sindicais e associativas críticas da área da saúde, esse processo também promove o fechamento do Hospital Universitário Garfreé e Guinle, referência no tratamento do HIV e nas especialidades de cirurgias corretivas.
Além do Hospital Federal dos Servidores do Estado, unidades que deveriam ser administradas pelo Ministério da Saúde também estão sendo dilapidadas. O Hospital Federal do Andaraí está sendo repassado para a administração do Município do Rio de Janeiro, que consequentemente irá repassar o mesmo para a administração de uma Organização Social da Saúde (OSS). Ou seja, um processo de privatização. O Hospital Federal de Ipanema está sendo repassado para controle do Grupo Hospitalar Conceição, uma empresa pública de direito privado (entidade que visa o lucro). E outras unidades como o Hospital Federal de Bonsucesso, Hospital Federal da Lagoa e Hospital Federal Cardoso Fontes estão ameaçadas de privatização indireta, podendo ser repassadas para administração estadual ou municipal e, posteriormente, para a gestão de uma OSS, a exemplo do que deverá acontecer com o Hospital Federal do Andaraí.
O Convênio assinado pela Uerj coloca o Hospital Universitário Pedro Ernesto como uma “válvula de escoamento” do corpo clínico dos hospitais federais existentes no Estado do Rio de Janeiro e aprofunda o processo de desmonte, abrindo caminho irrestrito para a privatização dessas unidades.
Ponto 2: O convênio enfraquece profundamente as lutas sindicais e gera caos profundo na gestão de pessoal
A assinatura do convênio entre a Uerj e o Ministério da Saúde é um duro golpe na luta em defesa de um SUS forte e em defesa de uma saúde pública, gratuita e socialmente referenciada. A cessão de profissionais para o Hupe enfraquece o corpo clínico das unidades federais e esvazia a luta sindical travada contra o sucateamento e a privatização. O Sintuperj defende solidariamente a luta do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social no Estado do Rio de Janeiro (Sindisprev) em defesa das categorias dos servidores federais da área da saúde e contra o desmonte e a privatização das unidades geridas pelo Ministério da Saúde no Estado do Rio de Janeiro.
Outro aspecto negativo desse convênio é que a absorção desses profissionais pela Uerj irá provocar um caos generalizado na gestão de pessoal e na isonomia entre os trabalhadores. Na maioria absoluta dos casos, servidores estaduais e federais que exercem as mesmas atividades e possuem cargos análogos terão vencimentos violentamente discrepantes no mesmo espaço de atuação. Também existe a preocupação latente que a chegada desses profissionais irá paralisar a realização de concursos públicos e a chamada de aprovados nos concursos já realizados pela universidade.
O Sintuperj defende que o corpo clínico e o corpo administrativo do Hospital Universitário Pedro Ernesto e das demais unidades de saúde da Uerj (Policlínica Universitária Piquet Carneiro, PUPC, e Hospital Universitário Reitor Hesio Cordeiro, HURHC), sejam totalmente formados por servidores da própria Uerj, aprovados em concursos públicos, empossados e regidos unicamente pelo Plano de Carreira dos servidores técnico-administrativos da universidade (Lei Estadual nº 6701, de 2014).
Ponto 3: O Convênio foi assinado sem qualquer transparência
O Sintuperj ressalta que a realização de convênios entre a Uerj e outros órgãos e instituições pode ser salutar para o desenvolvimento das áreas de ensino, pesquisa, extensão universitária e atendimento às demandas mais urgentes e necessárias da população fluminense. No entanto, os objetivos dos convênios assinados pela universidade devem ser pontuais e explícitos. Ter como objetivo “fortalecer do Sistema Único de Saúde”, é uma justificativa genérica e demoagógica que não explica de nenhuma maneira um acordo dessa natureza. Fortalecer como? De que maneira? Em que áreas específicas? Quais as contrapartidas? Quais os benefícios para as partes? Nenhum desses questionamentos são respondidos no documento.
Outro ponto delicado relacionado à assinatura desse convênio é a falta de debate com as instâncias da universidade. O acordo não foi debatido no Conselho Universitário (Consun), no Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (CSEPE), nem com os trabalhadores do Hupe. Ou seja, é imposto de cima para baixo por uma reitoria que se diz “democrática e aberta ao diálogo”. A equipe jurídica do Sintuperj está analisando essa questão no sentido de responder à comunidade universitária se esse tipo de acordo pode ser estabelecido sem que seja deliberado pelas instâncias superiores da universidade, Consun e CSEPE.
O terceiro ponto, e que deixa mais claro ainda a falta de lisura e transparência desse convênio, é o foro escolhido para a contestação do mesmo. Na cláusula sexta, fica estabelecido o “Foro da Justiça Federal, Seção Judiciária do Estado de Pernambuco, com renúncia expressa a outros, por mais privilegiados que forem, para dirimir quaisquer questões fundados neste Convênio”. Ou seja, para qualquer tipo de contestação, o interessado deverá se deslocar para o Estado de Pernambuco para ingressar com uma ação, mesmo que as partes envolvidas no acordo sejam dos estados do Rio de Janeiro (Uerj), do Distrito Federal (Ministério da Saúde) e existam no Rio de Janeiro a Seção Judiciária da Justiça Federal no Estado do Rio de Janeiro (JFRJ) e o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) para tal.
O Sintuperj reivindica a suspensão imediata desse convênio entre o Hospital Universitário Pedro Ernesto e o Ministério da Saúde e defende o fortalecimento das lutas contra o sucateamento dos serviços tanto nas unidades de saúde da universidade quanto nas unidades federais. A reitoria da Uerj tem muitos problemas internos e demandas não atendidas de trabalhadores e estudantes e deve se debruçar sobre essas questões para dar respostas contundentes e imediatas, e não fazer com que a Uerj e o Hupe sirvam como facilitadores para o desmonte das instituições públicas da saúde no Estado do Rio de Janeiro.
Confira o documento do convênio assinado:
Convênio Hupe e Ministério da Saúde (Retirado do Sistema SEI)