Parlamentar grega alerta o Brasil para consequências do aumento da dívida pública

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A Assembleia Legislativa recebeu a ex-presidente do Parlamento grego Zoe Konstantopoulou na última segunda-feira (13/11) para a palestra “Dívida Ativa, sonegação e incentivos x favor fiscal”. Organizado pela Comissão de Representação para Cobrança da Dívida Ativa, presidida pelo deputado estadual Paulo Ramos (PSoL), o evento tinha como objetivo trazer a realidade do país europeu que em 2010 passou por processo de grande endividamento, semelhante ao ocorrido no Brasil nos últimos anos.

Coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lúcia Fatorelli explicou que no Brasil estão sendo desviados ilegalmente recursos orçamentários em forma de operação de crédito que são “proibidas constitucionalmente”. O processo começa no pagamento de tributos pelo contribuinte aos bancos. Parte destes recursos, que segundo a Lei deveriam ser totalmente repassados aos entes federados (União, Estados e Municípios) são direcionados para uma conta vinculada, resultando em uma arrecadação menor por parte do governo. Para ela, o procedimento configura um “Sequestro da arrecadação”, que “em três anos e dois meses gerou R$ 70 milhões de perdas ao município de Belo Horizonte”. Prossegui: “essas ilegalidades não poderiam ser aprovadas sem conhecimentos dos órgãos de controle e políticos. Elas rompem com princípio orçamentário, como se fosse caixa dois”, afirmou. Ela defendeu a responsabilização política e a punição dos órgãos de controle por sua omissão.

Dando início ao seu relato, a parlamentar grega Zoe Konstantopoulou explicou que quando seu partido foi eleito, ela enxergava em seus mandato a obrigação de mostrar a verdade sobre a dívida. De que ela estava relacionada à corrupção, à especulação, a salvar bancos privados alemães e franceses etc. Durante seu mandato a frente do Parlamento, Zoe formou um Comitê da Verdade da Dívida Grega composto exclusivamente por membros da sociedade civil. O objetivo, segundo ela, era garantir que a verdade não fosse escondida. Ainda de acordo com ela, o relatório produzido pelo Comitê concluiu que o endividamento do país não foi gerado pelo povo, mas sim de forma ilegal, e que a população não deveria pagar.

Zoe lembrou que em 2010, o discurso oficial alertava para um aumento do endividamento do país e da necessidade de a população sacrificar-se para pagar sem, no entanto, explicar a origem da dívida e nem como ela seria paga. E que a mídia apoiava o discurso do governo. Acordos entre o governo grego e o Fundo Monetário Internacional (FMI) estabeleceram empréstimos à Grécia com a condição de o país se submeter a medidas estipuladas pelos credores. Um processo semelhante ao esquema de securitização promovida no Brasil. O parlamento então, ainda de acordo com ela, se submeteu às condições impostas pelos credores para o pagamento da divida, gerando cortes nos rendimentos do cidadão, entrega do patrimônio público ao capital privado, desemprego em massa, sobretudo de mulheres jovens (72%) e migrações de gregos para outros países são alguns exemplos. Na Saúde, de acordo com a parlamentar, a situação grega chegou ao cenário de estatisticamente uma enfermeira ficar responsável por 40 pacientes. Nas escolas, faltam livros e professores. De acordo com ela, o sistema submete a população por meio do endividamento, exterminando os direitos sociais e humanos. Hoje um grego recém nascido já deve  ‎€ 45.000, o equivalente a quase R$ 150.000,00. O endividamento do país passou de 120% do valor do PIB do país para 870%.

A parlamentar afirmou ainda que o próprio processo democrático foi afetado, pois dezenas de projetos enviados ao parlamento foram votados em regime de urgência, sem o devido conhecimento e debate por parte dos parlamentares. Zoe citou dois deles: um de 700 páginas e outro de 7.500 páginas que foram aprovados em 24 horas.

Gregos dizem não ao pagamento da dívida

Em julho de 2015, foi realizado um referendo no qual a povo grego deveria dizer se aprovavam se submeter a mais cortes para pagar dívida. Segundo Zoe, o povo sofria ameaças de que se votasse não morreria, pois não haveria mais condições de prover alimentos e medicamentos. E mesmo assim o povo disse “não”. Para Zoe, foi o momento mais glorioso da história recente do país, pois a população deixou claro que não mais se submeteria à escravização. Segundo ela, os credores se recusaram a aceitar o resultado do referendo e impuseram novas medidas de votação urgente, um golpe de estado contra a população grega. E o parlamento foi dissolvido pelo governo para não continuar com as investigações.

Por fim, a parlamentar ressaltou que a experiência vivida pela Grécia não deve acontecer mais em nenhuma parte do mundo. Que o primeiro passo para isso é conhecer, pois o que ocorreu na Grécia está sendo trazido para o Brasil. E que o único que pode impedir é a população, afirmou.

O deputado estadual Eliomar Coelho (PSoL) louvou a atitude da deputada em se dispor a visitar outros países por solidariedade e para lutar em defesa das populações mais exploradas.

Por sua vez, Luiz Paulo Corrêa (PSDB) ressaltou a coragem e bravura da parlamentar grega em não apenas enfrentar como também de compartilhar a experiência grega. Para ele, a Grécia não foi escolhida à toa, pois ela tem papel importante na irradiação da democracia pelo mundo. “Políticos recorreram à filosofia grega para consubstanciar suas concepções”. Ele defendeu a responsabilização dos governantes responsáveis por endividamentos mediante auditorias completas, que elucidem como foi construída a dívida, com resultado e efeitos sobre as finanças. “Hoje a dívida do estado do Rio de Janeiro chega a R$ 107 bilhões. Muitos não sabem como foi construída, mesmo quem está no parlamento. A única culpa, segundo governo, foi queda do petróleo”, o que para o deputado não explica. Ele também disse que concorda parcialmente que a razão seja os incentivos ficais, já que o estado dá R$ 9 bilhões de incentivos, num orçamento de R$ 65 bilhões. “Só de incentivos e serviço da Dívida são 18 bilhões”, concluiu.

O coordenador geral do Sintuperj Antônio Virgínio e o delegado do Sintuperj/Uenf estiveram presentes ao evento.