Audiência pública defende maior diálogo entre universidade pública e sociedade

A Audiência Pública “Sem universidade pública não há soberania nacional” reuniu servidores públicos, estudantes, parlamentares e integrantes de movimentos sociais na Capela Ecumênica do campus Maracanã da Uerj. De iniciativa do vereador Leonel Brizola Neto (PSoL), o evento discutiu a importância das universidades não apenas para o Estado como também para o município do Rio. Assim como as conseqüências sociais da política de governo que vem destruindo os serviços públicos, como Educação e Saúde.

O reitor da Uerj, Ruy Garcia, fez um relato sobre a situação da Uerj ao longo dos últimos dois anos, com ênfase ao desfinanciamento da universidade e aos atrasos salariais e dos repasses pelo governo do Estado. Segundo ele, a situação vivida pelas universidades estaduais fluminenses é um “ensaio do desmonte das universidades públicas do país”.

Diretora de Administração Financeira (DAF) da Uerj, Maria Thereza, contra argumentou a pecha de que a universidade é uma gasto do governo. “A universidade não tem gasto. Tem despesa. E todos nós pagamos por ela”. Ela também lamentou as saídas de servidores que diante dos atrasos salariais se vêem forçados a deixarem a universidade. “Cada vez que um servidor sai, mais um deixa de contribuir. A universidade compete com o conhecimento de outros países. Se não houver produção de conhecimento, teremos que comprar o que eles produzirem. E nem sempre nos interessa”, completou. Ela ainda defendeu uma organização interna e de gestão com vias a reconquistar a autonomia financeira, elemento fundamental para a existência da universidade.

Representando o movimento Uerj Resiste, o professor Renê Forster ressaltou que o papel social da universidade vai além de ser um “espaço para ter aula e ganhar diploma”. Ele reforçou que a instituição superior pública também pensa o Estado a longo prazo, discutindo e propondo, por exemplo, políticas sociais de inclusão. Para ele, o governador Pezão atrasa os salários “porque usa o salário como moeda de troca”. Lembrou ainda que outras políticas de governo já acabaram com políticas de estado, mencionando a desestruturação dos CIEPs pelos sucessores do ex-governador Leonel Brizola, que não viram nestas escolas “um instrumento de fortalecimento da Educação.

O coordenador geral do Sintuperj Jorge Luís Mattos (Gaúcho) agradeceu o apoio dos parlamentares contra o projeto que visa aniquilar não apenas as universidades como as escolas da rede Faetec (Fundação de Apoio à Escola Técnica) e reiterou “que a universidade deve expor à sociedade tudo o que ela faz e propagar o risco que a sociedade tem em perder” as universidades públicas. “Ou nós nos mobilizamos ou afundaremos todos”, garantiu. Ele citou a grande mobilização dos médicos municipais, em greve desde o dia 26 de outubro contra os atrasos dos salários e falta de insumos e medicamentos nas Clínicas da Família, que acabara de lotar o Auditório 71 da Uerj. Por fim, ele afirmou que o governo “asfixia a universidade, reduz o quantitativo de alunos para depois distribuí-los para as universidade privadas.

O diretor da Asduerj Rodrigo Reis ratificou que a universidade pública “gera quase todo o conhecimento”, mas que para isso é preciso que ela seja autônoma. Do contrário, ela seria apenas uma transferidora “de conteúdo de agentes privados, sem pensamento crítico”. Sobre a Uerj, especificamente, ele ressaltou que a crise na universidade afeta os arredores da instituição, o processo de interiorização do ensino superior, a formação de profissionais qualificados, inclusive, para o município do Rio, o fomento de políticas públicas, a relaização de estágio e residências etc. Ele destacou que o Hospital Universitário Pedro Ernesto (Hupe) e a Policlínica Piquet Carneiro são pólos de atendimento importantes na combalida rede de atendimento à Saúde. Além disso, a Uerj possui um dos poucos CAPs ainda existentes. O docente também mencionou como atividades desenvolvidas pela Uerj, a discussão de propostas para a redução da violência, de inclusão de moradores de rua entre outros.

Diretora do DCE (Diretório Central dos Estudantes) da Uerj, Nathália Trindade defendeu a necessidade de se discutir “como colocar essa ampla frente em defesa da Educação em prática”. Ela criticou o discurso do governador Pezão que sectariza os serviços públicos. “Se nós perdemos o Hupe, haverá um efeito em cadeia”, ressaltando que além dos atendimentos de saúde a própria formação acadêmica será afetada, entre outras consequências.

Nathália também criticou a pouca visibilidade que universidade pública tem no âmbito social fluminense. “Proporcionalmente o Rio de Janeiro tem mais universidades públicas, mas não se discute universidade pública. O governo trata passe livre como esmola”, afirmou. Ela ainda condenou os atrasos das bolsas estudantis que têm obrigado estudantes a desistirem da universidade para terem que trabalhar para sobreviver.

Deputado estadual, Wanderson Nogueira (PSoL) ressaltou que as falas anteriores não deixaram dúvidas de que a Uerj é importante também para o município do Rio de Janeiro. Nesse sentido, ele criticou a postura do prefeito do Rio Marcelo Crivella que ignora a crise de uma instituição fundamental para a cidade. Além disso, ele afirmou que “enfraquecer a Uerj é enfraquecer a revolução, o nacionalismo”. E as pessoas não percebem porque o governo asfixia a universidade”.

O deputado estadual Waldeck Carneiro (PT) afirmou que o município pode e deve ajudar a Uerj mediante um “acordo de cooperação técnica”. Defendeu a aprovação de uma lei que garanta repasses às universidades em duodécimos, como garantia da execução de repasses. Mas o parlamentar fez uma alerta: “vai precisar de muita pressão para avançar a lei dos duodécimos”.

Vereador do Rio, Renato Cinco (PSoL) afirmou que não consegue vislumbrar outro cenário senão um piora no quadro social antes de uma possível melhora. Segundo ele, o capital está promovendo o maior ataque da História aos direitos sociais e trabalhistas. “O sucesso deste processo de ataques ao direito é incompatível com qualquer regime democrático, mesmo o regime de fachada que nós temos. Estamos chegando a um momento da luta de classes em que ou derrotamos os nossos inimigos ou seremos massacrados por eles”. Para enfrentar essa situação que todo o país, a classe trabalhadora precisa abandonar duas ilusões. Uma delas, é achar que vai resolver os problemas da classe trabalhadora pela institucionalidade. “Precisamos aprender com nossa história recente. O momento em que a classe trabalhadora mais avançou foi na derrocada da Ditadura Militar. Foi através da luta de base que derrotamos a Ditadura”, lembrou.

Segundo ele, após a queda do regime ditatorial surgiu a segunda ilusão que também é preciso ser abandonada: “a ilusão de que é possível domesticar o capitalismo brasileiro. Dizem que socialistas são utópicos. Muito mais utópicos são aqueles que acham que é possível estado de bem estar social no Brasil. A burguesia nacional não permitirá. Para derrotar esse avanço terrível do capital sobre os direitos dos trabalhadores precisamos retomar o processo de mobilização social no nível daquele que derrotou a Ditadura Militar”, garantiu. Por fim, afirmou que, apesar das críticas a serem feitas, a União Soviética faz muita falta, pois hoje o mundo está entregue ao capitalismo autoritário, sem qualquer discussão de ideias.

O vereador Leonel Brizola Neto (PSoL) afirmou que quando colocam que a universidade é cara, ele se lembra de um debate entre Fernando Henrique Cardoso e Brizola. Na ocasião, segundo ele, Fernando Henrique afirmara que os CIEPs custavam caros. Em resposta, Brizola afirmou que “caro é o custo da ignorância do país”. Segundo Brizola Neto, o orçamento municipal de 2018 está previsto em quase R$ 30 bilhões, com 30% de margem de realocação de recursos. Nesse sentido, afirmou que levará propostas de negociação com a Prefeitura no sentido de ela trabalhar conjuntamente com a Uerj. “Onde não há desenvolvimento não há tecnologia, não há emprego. O prefeito tem que se colocar à disposição porque a prefeitura absorve diretamente [os profissionais formados nas universidades públicas]. Dinheiro tem. Falta vontade política. Temos que estender essa discussão para toda a população”, concluiu.

Os coordenadores do Sintuperj Simone Damasceno e Antônio Virgínio durante a Audiência Pública.

Também estiveram presentes pelo Sintuperj a coordenadora geral, Regina de Souza, e o delegado sindical Sintuperj/Uenf Sérgio Dutra (ao fundo).