Uerj sedia encontro internacional sobre democracia, igualdade e desenvolvimento

A Uerj sedia nos dias 29 e 30/03, em seu Teatro Odylo Costa, filho, e na Concha Acústica Marielle Franco, o Encontro Internacional Democracia e Igualdade: Para um novo modelo solidário de desenvolvimento. Organizado pela PR-3, Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da Universidade, e pelo Grupo de Puebla, fórum político e econômico formado por representantes políticos do campo da esquerda em todo o planeta.

Com a participação de personalidades nacionais e internacionais do campo da política progressista, o evento tem como objetivo discutir pontos como os horizontes da política democrática, modelos de desenvolvimento solidário, igualdade e democracia nos governos progressistas, desafios para a integração latino-americana, pandemia é pós-pandemia, e transformações sociais e justiça social, dentre outros temas.

Na manhã deste primeiro dia do encontro internacional o Sintuperj se fez presente através das coordenadoras gerais Cassia Gonçalves Santos da Silveira e Regina de Souza, do coordenador de Formação e Comunicação Sindical Carlos Alberto Silveira e do coordenador jurídico Sérgio Dutra.

Confira os debates da manhã de 29/03, primeiro dia de evento:


Na apresentação do evento, reafirmação da liberdade democrática e da unidade das forças políticas da América Latina

O encontro teve início às 10h com uma rodada de apresentação, que contou com a participação do ex-ministro Aloizio Mercadante, coordenador do Grupo de Puebla, e do reitor da Uerj, Ricardo Lodi. Nesse espaço de abertura foram abordadas as dificuldades e perseguições pelas quais passaram os campos democráticos e progressistas na América Latina.

Ao iniciar o evento, o reitor Ricardo Lodi ressaltou a importância de um evento institucional, acadêmico e científico como o encontro internacional, e a Uerj irá defender a liberdade de pensamento e discussão que constrói a democracia sempre que necessário.

O ex-ministro Aloizio Mercadante apontou a necessidade de união das forças políticas da América Latina para que o campo democrático progressista possa se manter unitário e forte para responder os ataques contra a democracia, como ocorreu no Paraguai com Fernando Lugo, na Argentina com Cristina Kirchner, na Bolívia com Evo Morales e no Brasil com Dilma Rousseff, governos legítimos que sofreram golpes de forças antidemocráticas e baseadas no lawfare (perseguição jurídica).

Conferência inaugural discute novos horizontes da política democrática

Após a etapa de apresentação do evento, teve início às 10:20h a conferência inaugural que contou com a participação do reitor da Uerj, Ricardo Lodi, apresentando a discussão, e com o ex-presidente da Espanha, José Luiz Rodrigues Zapatero, que abordou em sua palestra a luta pela igualdade dos povos e a democracia como ponto de defesa histórico e político.

O ex-presidente espanhol iniciou sua explanação comentando a guerra que ocorre atualmente na Ucrânia, e apontou que é importante que se busque um acordo de paz com respeito entre os povos, pois a guerra abre portas para outros conflitos e impacta todos os continentes. Zapatero ressaltou que é necessário que se interrompa o ciclo de violência não só na Ucrânia, mas em outros países que estão sofrendo com ataques militares, como Iêmen e Líbia.

Em seguida, Zapatero abordou a questão das igualdades democráticas que foram um dos pontos de inspiração para as revoluções francesa, norte-americana e dos países da América Latina, e a análise central do ex-presidente espanhol apontou que não existe igualdade sem liberdade e sem o combate à pobreza. Zapatero avalia que atualmente nas sociedades da América Latina existem muitos “muros”, visíveis e invisíveis, heranças da escravidão e da concentração de renda, que levam a discriminação, opressão e violência.

Outro ponto do discurso de Zapatero é relativo à luta contra as discriminações, o machismo, o racismo e a homofobia e as demais formas de opressão. Para o palestrante, a democracia passa pelo respeito aos direitos das camadas vulnerabilizadas de sociedade, que sofrem com a imposição por meio da força e com as práticas discriminatórias, e por conta disso é necessário que a luta por uma sociedade democrática passa pela defesa da igualdade.

Zapatero finalizou sua palestra apontando que é necessário que a busca por igualdade e pela democracia passa pelos encontros, pela convivência física e pelo diálogo. O ex-presidente espanhol ressaltou que as ferramentas online passam uma sensação de que hoje as pessoas são mais bem informadas, mas é necessário confrontar as informações produzidas utilizando o fator presencial para uma verdadeira percepção da realidade.

Ex-presidentes da América Latina debatem novos modelos de desenvolvimento solidário

A segunda mesa de discussões do encontro, que teve início às 11:30h, contou com a participação dos ex-presidentes Dilma Rousseff (Brasil) e Ernesto Samper (Colômbia), e apresentação da coordenadora do Grupo de Puebla, Carol Proner. Em debate, a reflexão sobre a criação de um novo modelo de desenvolvimento solidário que contemple os povos latinos e suas aspirações. O ex-presidente do Paraguai, Fernando Lugo, que estava confirmado no evento, não pôde participar por motivos pessoais.

A primeira parte das discussões foi conduzida pelo ex-presidente da Colômbia, Ernesto Samper, que iniciou sua explanação reconhecendo os esforços dos governos progressistas que buscaram o desenvolvimento dos povos da América Latina e foram atacados burocraticamente e judicialmente por forças que defendem o atraso e a desigualdade. Em seguida, Samper abordou as dificuldades que a pandemia impôs aos povos da América Latina, apontando que é necessário um modelo diferente do que existia antes da Covid-19 para que sejam vencidos desafios como a fome, o desemprego e a desigualdade, que voltaram a assombrar os países por ação de governos neoliberais e que flertam com o fascismo.

Em seguida, Samper apontou que houve um ciclo virtuoso de combate à desigualdade na América Latina entre os anos de 2004 e 2014, quando os países da região conseguiram tirar cerca de 100 milhões de pessoas da linha da extrema pobreza, trabalho esse que precisa ser retomado e intensificado pois a desigualdade tem aspectos históricos e é herança da escravidão e da exploração. O ex-presidente colombiano afirmou que o modelo neoliberal não dá conta desses desafios pois impacta os Estados e acaba com as possibilidades de integração da região, além de transformar as principais necessidades da população em negócios que visam o lucro.

Em seguida, Samper apontou que a defesa de um novo modelo de desenvolvimento da América Latina passa por mudanças profundas: a proposição de um novo pacto ambiental, com a defesa da região amazônica e das bacias aquíferas; novas práticas de gestão trabalhista, que migre os trabalhadores da informalidade para o emprego formal (atualmente 56% dos trabalhadores da América Latina se encontram em situação de informalidade e subemprego); reforma tributária, para que a classe média trabalhadora não seja a maior responsável pelo pagamento de impostos para os Estados, mas que haja o equilíbrio para que paguem mais impostos aqueles que concentram mais lucros; defesa das reformas agrária e urbana, o que chamou de “revolução democrática da propriedade”, para garantir que os trabalhadores do campo e da cidade tenham a dignidade do direito à moradia; defesa da educação pública, para acabar com a desigualdade entre os mais e menos favorecidos; garantia de previdência para a população; e democratização das ferramentas de comunicação e de redes.

A segunda parte da mesa de debates foi conduzida pela ex-presidente Dilma Rousseff, que em sua palestra agradeceu ao reitor da Uerj, Ricardo Lodi, que foi um dos responsáveis por desconstruir a acusação que levou ao seu impeachment. Dilma apontou que a acusação de “pedaladas fiscais” foi uma forma de violência contra quem buscou incluir as políticas de enfrentamento à pobreza e os trabalhadores e pobres no orçamento público.

Em seguida, Dilma Rousseff fez um recorte histórico remetendo aos anos 1990 e apontando que as políticas neoliberais e conservadoras, por meio do Consenso de Washington e da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) levaram à quebra de Brasil e de Argentina no início dos anos 2000. Com a entrada de um governo progressista no Brasil, a partir de 2003 com Lula, o Brasil conseguiu se livrar desse ciclo, o que fez com que o país conseguisse investir nos programas sociais que levaram o mesmo a sair do mapa da fome da ONU no ano de 2014. Outros indicadores também foram apresentados, como a menor taxa de desemprego no ano de 2014 (4,8%) e as menores taxas de desmatamento da Amazônia por cinco anos consecutivos (de 2009 a 2014), o que na atualidade é premente para uma nova lógica de desenvolvimento baseada na meta de zerar as emissões de Carbono (conforme refém compromissos internacionais na área de meio-ambiente).

Em seguida, a ex-presidente do Brasil apontou as atuais questões internacionais como complicadores para as discussões de matrizes energéticas no país, e defendeu sua postura enquanto governo de não atrelar os preços dos combustíveis no Brasil aos preços internacionais. As consequências do conflito entre Ucrânia e Rússia pode levar a um processo de “desglobalização”, que tende a regionalizar as cadeias de produção e fornecimento das matrizes energéticas, o que mostra que a posição do governo brasileiro à época se mostrou acertada, e essa postura deve ser centralizada na integração regional da América Latina, com cooperação entre os países da região.

Outro ponto defendido por Dilma Rousseff foi a reindustrialização da América Latina no contexto da Quarta Revolução Industrial que está em curso, pois a região não pode ser condenada a atuar como simples produtora de commodities e importadora de tecnologias. Será necessário construir um polo de negociações para compartilhamento de tecnologias com outras regiões como Europa e China, existindo inclusive a possibilidade de negociações comerciais entre os países em moedas locais, sem a utilização do Dólar como base, o que valoriza as moedas locais mas ao mesmo tempo cria uma secessão nas relações.

Em defesa de um novo modelo de desenvolvimento, a ex-presidente encerrou sua explanação defendendo investimentos em educação, ciência e tecnologia, o que em sua visão levará a criação de uma novo ciclo de crescimento baseado na igualdade social e no respeito entre os povos da América Latina.